Uma boquinha na Terra
A liberdade, Sancho, não é um pedaço de pão. Dom Quixote Há muitos anos eu não encarnava na Terra. Acho que tinha esquecido que é feito cheirar cocaína: no dia seguinte, com a ressaca se convertendo no desânimo que se instaura por pelo menos uma semana, fica fácil dizer que nunca mais, mas passam-se alguns meses e no calor de festa você se faz de esquecido e dá de novo o bendito raio. Claro: pra mais uma vez no dia seguinte, merda, dizer que nunca mais, recomeçando o ciclo. Eu já devo ter dito muitas vezes que nunca mais. Contudo, passeando pela Terra feito Isaac agarrado em Angélica, do filme do Manoel de Oliveira, senti o aroma de churrasco e não pensei duas vezes: vou reencarnar. É isto: me refiz carne pela comida. Sou evoluído, não precisava voltar, mas a fome falou mais alto. Outros seres, de luz como eu, me alertaram: se tu queres retornar àquela selvageria onde se come tudo o que é vivo – porque lá ninguém se alimenta do que não é orgânico –, é por tua própria conta e risco. Vai